O sujeito, quando ainda cientista
social recém-formado, percebeu-se tão fascinado por conceitos que resolveu os
colecionar. Começou pelos mais fáceis de serem encontrados, considerados os
mais primordiais a qualquer coleção de conceitos: poder, ideologia, classe
social, Estado. Foi quando finalmente conseguiu o de orientalismo que percebeu
que sua estante estava lotada. Logo, teve que comprar outra, para que coubessem
McDonaldização, rotinização, anarqueologia, ato ilocutório e tantos outros que
conseguiu na sequência. De repente, a segunda estante já não era o bastante,
teve que comprar uma terceira, depois uma quarta, uma quinta... Fez de um
cômodo vazio da casa um espaço para seu vasto acervo conceitual.
Orgulhava-se
de sua coleção. Por alguns itens, evidentemente, tinha especial apreço.
Deleitava-se pelos gregos, particularmente paideia
e eudemonia, e pelos latinos,
como potestas. Seu encanto maior era
com aqueles raros, pouco conhecidos pelos mortais, a que, para conseguir, teve
que se aventurar entre prateleiras empoeiradas de bibliotecas esquecidas de
paragens inóspitas.
Sistemático
com o seu material, assegurava-se de dispor todos os conceitos de forma
ordenada, em conformidade com um complexo sistema de categorização que criou.
Assim procedia como garantia de que, caso indagado sobre a posse de algum
conceito por uma visita, poderia imediatamente localizá-lo e apresentar ao
inquiridor. Corrigindo: mesmo quando não questionado, demonstrava alguns dos
itens, independentemente do interesse ou curiosidade do convidado. Adquiriu
fama de anfitrião inoportuno e pedante.
Além de
devidamente organizados, mantinha-os impecavelmente limpos. Seu zelo por cada
conceito era tanto que evitava o uso. Todo colecionador sabe que um artigo
muito manuseado pode sofrer avarias que comprometem seu valor. Talvez por
isso desenvolveu o hábito de substituir a utilização dos seus preciosos e
sofisticados conceitos por memes e sofismas.
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