20 de setembro de 2007

Os Saqueadores

Numa quinta-feira já distante, dia 30 de agosto, houve um acidente entre dois trens da SuperVia em Nova Iguaçu. Um era apenas de teste, então transportava poucas pessoas; em contrapartida, o outro levava consigo cerca de 800 passageiros, segundo as estimativas oficiais. Foram 8 mortos e 101 feridos, conforme divulgado pela mídia. Mas o objetivo deste texto não é discutir números – este é um papel das autoridades e não meu; o debate aqui se distancia da estatística e se aproxima do antropológico.
Uma reportagem do dia 31 do site G1 denunciou a ocorrência de saques às vítimas do acidente. Em seguida, várias outras agências de notícia divulgaram o ocorrido. Estão à disposição de qualquer um vários relatos de testemunhas dos tais furtos oportunistas.
O fato de que, num cenário tomado por ferros contorcidos e pessoas queimadas, mutiladas, sagrando e gritando de dor, alguém tenha se lembrado de tomar para si objetos de valor me surpreende. E, para aumentar ainda mais o meu choque, que este alguém consiga não demonstrar qualquer compaixão ou, pelo menos, mal-estar pelo outro em sofrimento e em desespero, concentrando-se apenas em se aproveitar da situação. Segundo depoimento dado por um morador ao G1: “Havia sangue pra todo lado, mas os ladrões não quiseram nem saber e roubaram o que puderam”. Um outro relato divulgado pelo jornal foi ainda mais significativo: “Eu vi um dos ladrões passando ao lado de uma mulher grávida pela janela. Ele não ofereceu ajuda”.
Ao que tudo indica, vida de um desconhecido para estes indivíduos nada vale. A dor ou a possibilidade de morte do outro não os comoveu e, por isso, só não trataram o acidente com total indiferença ou apenas com alguma curiosidade mórbida e sádica porque viram nele a oportunidade de lucro. Aproveitar-se dos infortúnios alheios para benefício próprio ignorando as necessidades urgentes alheias foi o que estes jovens fizeram. Talvez, o fizeram inconscientemente: já acostumados a não se preocuparem com o outro, não perceberam que havia, ali, seres humanos tais como eles desejando socorro e que eles poderiam ajudar. Não sei no que prefiro acreditar: que o individualismo se tornou um valor a tal ponto enraizado na mentalidade dos jovens desprivilegiados ou se diante de um agouro do destino de 800 pessoas o primeiro reflexo dessas pessoas foi saquear por obediência a leis psicológicas de caráter determinista.
No site da Folha Online, a reportagem sobre o acidente inclui um depoimento a mais do que na notícia original do G1. O professor Carlos Nascimento, durante o reconhecimento do corpo da esposa, uma das vítimas fatais, notou que faltava a aliança da mulher. Desconsiderado as outras possíveis explicações para a ausência do objeto no dedo da mulher, vale a pena fazer referência a um trecho da declaração dada por Carlos sobre o episódio: “Mas, quando as pessoas ajudam e levam para IML, essas coisas sempre acontecem. É normal. Quer dizer: não é normal, né?”.
O oportunismo, em nossa sociedade, é visto como inevitável. Num momento em que um indivíduo encontra-se incapaz de garantir a posse dos seus pertences, já é esperado que alguém lhe furte. Com esta visão, naturaliza-se o aproveitamento de um desafortunado através de uma ação egoísta. Por isso, Carlos não se surpreendeu com o possível furto da aliança da esposa morta – e por que haveria de se surpreender, já que este é o “normal” neste caso? Por outro lado, talvez também por isso que houve os saques: “é normal roubar coisas em situações assim. Se não roubar eu, outro roubará”, devem ter pensado os saqueadores, raciocínio que os levou a relativizar a imoralidade do ato e a não sentir remorso com o furto.
A partir das reflexões deste caso específico, pode-se divagar que o crime por si só não é o problema, mas sim o contexto social e cultural no qual estão inseridos os criminosos que propicia o desrespeito às leis. Há um conjunto de fatores que levam aquela sociedade a ver como algo normal o que ela própria determina como comportamento indevido. Dentre elas, pode-se citar a impunidade e a filosofia do “se os outros fazem, por que não posso também fazer?”.

O novo Textando!

Caros leitores,

Desde 2004 [parece que foi ontem!] venho mantendo o Textando no ar, atualizando-o sempre quando posso e quero. O UOL Blog, durante muito tempo, satisfez minhas expectativas e exigências e não tive do que reclamar. Aliás, não tenho muito do que reclamar do Uol Blog, exceto de que ele vinha me limitando em certos aspectos e que ele vinha me extressando um pouco por razões práticas.

Enfim, há a possibilidade de que o Textando entre numa nova fase, em que migrará do UOL Blog para outro servidor. No momento, estou testando esse aqui, o Blogger; caso eu me adapte a ele, eu o continuarei usando e migrarei definitivamente o Textando para cá. Do contrário, bem, acho que deverei continuar com o endereço antigo do Textando.

De qualquer forma, como há muitos posts e alguns dos quais não tenho algum tipo de backup, não deletarei a antiga página do Textando, apenas a abandonarei. Inclusive, penso em re-postar aqui o que houve de melhor e mais significativo publicado anteriormente, ajudando-me num já tão necessário trabalho de reciclagem do material.

Então, é isso aí galera. Bem-vindos ao possível novo Textando!